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ganhos potenciais resultantes da prescrição por enfermeiros- Artigo de opinião

Com diferentes gradações entre países, a prescrição farmacológica por enfermeiros é hoje uma realidade na Austrália, no Canadá, nos Estados Unidos da América, na Finlândia, na Irlanda, na Noruega, na Nova Zelândia, no Reino Unido, na Suécia e, mais recentemente, na Espanha e na Holanda. Com efeito, vários sistemas de serviços de saúde procuraram, através de uma combinação mais eficiente da força de trabalho em saúde, contributos para responder às necessidades de melhoria do acesso, da eficácia, da integração e da qualidade dos cuidados e de redução da despesa. Uma das estratégias utilizadas foi a de, em circunstâncias específicas, atribuir à profissão de enfermagem o poder de prescrição farmacológica, tradicionalmente incluído apenas na jurisdição médica.

Esta opção tem suscitado hesitações em termos do impacto na qualidade e na segurança dos cuidados. Mas existe evidência disponível para a sustentar. Uma recente revisão sistemática da literatura comparou o impacto da prescrição por enfermeiros e por médicos em termos de quantidade, tipos de medicamentos e resultados em saúde obtidos pelos doentes, e analisou 35 estudos quantitativos, não obtendo diferenças significativas – os enfermeiros recorriam à prescrição farmacológica em número de casos semelhante ao dos médicos; os enfermeiros prescreviam, por doente, um número de medicamentos comparável ao dos médicos; os enfermeiros demostravam um perfil de prescrição, em termos de tipo e dosagem de medicamentos, idêntico aos dos médicos, obtendo resultados em saúde equiparáveis. A satisfação dos doentes tendia a ser igual ou superior nos cuidados prestados por enfermeiros mas o consumo de tempo por acto era também mais elevado neste caso.

A prescrição farmacológica por enfermeiros exige formação e treino e assume vários formatos. Em alguns os enfermeiros são prescritores independentes, sendo responsáveis pela avaliação clínica do doente, pela fixação do diagnóstico e pela definição do tratamento a seguir, nomeadamente, em termo dos medicamentos a tomar e considerando, ou não, uma lista fechada de fármacos. Noutros, como no seguimento de doentes crónicos estáveis, os enfermeiros são prescritores complementares, assumindo a renovação do receituário no âmbito de uma parceria com um médico que realizou a avaliação, diagnóstico e prescrição inicial. Noutros ainda, os enfermeiros podem prescrever medicamentos no quadro de protocolos para o tratamento de grupos específicos de doentes, em situações clínicas previamente discriminadas.

Qualquer que seja o modelo assumido – resultado do desenho concreto de cada sistema de saúde para responder às necessidades assistenciais da população que serve – a prescrição farmacológica por enfermeiros pode representar ganhos potenciais. Para os enfermeiros, na medida em que estimula a satisfação profissional com base numa maior autonomia decisória. Para os médicos, na medida em que liberta tempo de trabalho despendido a assinar prescrições na realidade já assumidas pelo enfermeiro da equipa. Para os doentes, na medida em que obtêm melhor acesso e cuidados menos fraccionados. Para o sistema de saúde, na medida em que reflecte uma utilização mais eficiente dos recursos disponíveis da qual resultam melhores níveis de cuidados.

Em Portugal, a exequibilidade desta opção tem conhecidas limitações legais face ao quadro normativo que regulamenta as profissões médica e de enfermagem, no qual a prescrição farmacológica constitui uma reserva médica absoluta, competindo ao enfermeiros apenas a administração da terapêutica instituída, excepto em situações de urgência. Por outro lado, junto das profissões, a aceitabilidade social da adequação desta solução ao contexto do sistema de saúde português carece de um forte investimento em consensualização, embora, em certas áreas da actividade assistencial, algumas equipas revelem uma maior disponibilidade para a inovação. A atribuição de incentivos remuneratórios a estas equipas de saúde e de pagamento diferenciado aos enfermeiros prescritores são um dos recursos possíveis para fomentar esta redistribuição do trabalho e para compensar o acréscimo de responsabilidade, no quadro de modelos organizacionais que já contemplam o pagamento pelo desempenho.

Em qualquer circunstância, não poderá esquecer-se que a prescrição farmacológica não é senão um acto e que o objectivo da obtenção de um skill mix mais eficiente entre médicos e enfermeiros não é a prática de actos, tradicionalmente da esfera médica, e sim uma maior autonomia clínica para a resposta às necessidades assistenciais, num contexto do reforço dos modelos colaborativos de cuidados, em que o trabalho da equipa de saúde envolve confiança, respeito mútuo, partilha do poder decisório e igualdade.

Autores:Gilles Dussault, Professor Catedrático Convidado, Instituto de Higiene e Medicina Tropical; Marta Temido, Administradora Hospitalar

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Fonte: Jornal Médico

 

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