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Marta Temido: ilusões e desafios

“(…) vemos grandes resplendores, onde não há luz, (…).” – Padre António Vieira

“O grande perigo que corremos, iludindo os outros, é que acabamos por nos iludirmos.” – Eléonor Duse

Tendo deixado chegar ao ponto a que as coisas chegaram, a Ministra da Saúde continua a negar, se não os problemas, pelo menos a gravidade das agruras que os cuidados de saúde enfrentam. Faltam pediatras na margem sul, cirurgiões a claudicar um pouco por tida a parte, obstetras ameaçam rotura aqui e ali, mais de meio milhão de utentes sem médico de família e em todos estes casos com tendência para agravamento. Contudo, Marta Temido emerge, perante cada nova crise, a tirar da cartola a solução, que até se afigura simples, mas que afinal é puramente ilusória quando se trata de aplicar ao mundo real. Veja-se o caso das urgências pediátricas do H. Garcia da Orta. Prometeu pediatras para colmataras brechas abertas pela míngua do corpo clínico do Hospital. O resultado foi as urgências hospitalares deixarem de funcionar no horário noturno e os médicos de família serem chamados a cobrir o deficit.

A talho de foice será oportuno realçar e estranhar a ausência de posição dos colegas pediatras que, há cerca de um mês, saíram a público verberando contra a inaptidão (em seu entender) dos Cuidados de Saúde Primários para cuidarem da crianças e jovens de Portugal. Substitui-se a assistência diferenciada em situações de urgência por profissionais supostamente impreparados e remetem-se estes salvacionistas das crianças ao silêncio? Adiante.

Faça-se a justiça de acreditar que a situação de pré-rotura a que chegou o SNS preocupa seriamente o ministério da saúde. Todavia, a postura de denegação permanente, aliada ao típico otimismo deste executivo, leva-nos a concluir o contrário: que pouco investe na busca de soluções, arregimentando todo capital imaginativo para manter uma máquina de propaganda cada vez menos convincente. Por exemplo: mantém o dedo na tecla do “incremento do número de profissionais no SNS” na vã esperança de silenciar que esse acréscimo fica bem aquém das necessidades e, mais grave, das potencialidades formativas. É impossível esconder o êxodo de profissionais, nomeadamente médicos, para fora do SNS, por muito que a Sra. Ministra o tente negar.

Duas soluções têm sido propostas para fazer face a este preocupante estado de coisas: aumentar o investimento e a incorporação compulsiva dos jovens médicos no SNS. Comecemos por esta. Há alguma razoabilidade no fundamento: a Nação despende avultadas somas na formação de médicos cujos competências darão no estrangeiro. No entanto, em termos práticos, será viável reter à força profissionais num SNS que não lhes é atrativo? Permitam-me um exemplo extremo. Para um jovem médico (já para não falar de enfermeiros ou outros profissionais) que seja colocado em Lisboa, ou no litoral do Algarve, o ordenado mal dá para pagar um alojamento decente. Impor a aceitação duma vaga nestas condições seria absurdo. Com exceção do exemplo anterior, só quem ande muito distraído, ou esteja de má fé, poderá argumentar que o salário é o principal motivo que leva os médicos a rejeitar a opção SNS. Em vez da persistente denegação, a que se entregam diversas vozes responsáveis da tutela, talvez fosse melhor começar por tentar esmiuçar o porquê desta rejeição. Bastará dar-se a tutela ao trabalho de tomar conhecimento dos testemunhos dos que imigraram para entendê-lo.

A irracionalidade e o excesso de carga laboral esmagam os profissionais. A tutela ignora a primeira e incrementa a segunda.

A irracionalidade de muitas práticas conduz a uma perda de produtividade arrepiante e que, para além de ser óbvia consumidora de recursos, desmotiva os profissionais. Por outro lado, o alto nível de desperdício do SNS fragiliza o argumento dos que defendem o reforço orçamental tout court. Investir num sistema insustentável é apenas adiar a sua morte e contribuir para falência de toda a Nação. E neste particular temos outros atores que se recusam a ver a realidade: todos os que acreditam que os problemas se resolvem regando-os com dinheiro, mantendo intocadas as aberrações funcionais do SNS. Urgem, portanto, mudanças que tornem menos hostil o SNS para profissionais e menos renitente a abertura dos cordões à bolsa por parte de decisores financeiros.

Posto isto, são deveras acertadas as palavras da Ministra: “ao dizer que a saúde está suborçamentada estamos a presumir que há uma diferença entre aquilo que se precisaria para trabalhar e aquilo que neste momento existe com receita para o sistema, isso é uma presunção, na medida em que não temos o sistema a trabalhar com toda a eficiência”. Mas para aumentar a eficiência há tomar decisões corajosas a começar pela imprescindível e inadiável vassourada no SPMS. Em termos de produtividade o SPMS está do lado do problema e não da solução. Não é possível dar cobertura às políticas do SPSMS e quer, simultaneamente, melhorar a qualidade da prestação dos serviços, aumentar a produtividade e incrementar a motivação dos profissionais.

A Ministra Marta Temido tem de fazer escolhas: ou manda no SPSMS ou permite que o SPMS mande na ministra; ou se rege pelos interesses da Nação, ou pelos do SPMS.

Fonte: Saúde Online

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