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Isabel Saraiva: Vacinação contra a tosse convulsa de doentes com DPOC previne impacto que “pode ser muito violento”

Para proteger as pessoas com doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), a Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD) alertou recentemente para a importância da vacinação contra a tosse convulsa nessa população. Segundo Isabel Saraiva, a tosse convulsa pode ter um impacto “muito violento” nos doentes com DPOC, que são cerca de 800 mil em Portugal. A presidente da RESPIRA falou-nos dos benefícios da vacinação, do trabalho desenvolvido na associação e do impacto da pandemia de Covid-19, advertindo também os fumadores: “90% das pessoas com DPOC são ex-fumadores” e “tabaco e Covid é realmente uma mistura explosiva”.

HealthNews (HN)- Qual é o impacto da tosse convulsa na exacerbação dos sintomas da DPOC?

Isabel Saraiva (IS)- O impacto pode ser muito violento. A DPOC é uma doença respiratória crónica que tem várias características, entre elas uma enorme vulnerabilidade do sistema respiratório. Isto é, as pessoas que têm DPOC, e eu incluo-me nesse grupo, são extremamente vulneráveis às infeções. E sendo a tosse convulsa um processo infecioso, é fácil perceber que qualquer proximidade com a tosse convulsa pode provocar situações complexas debaixo do ponto de vista da saúde respiratória.

O caso da tosse convulsa é um caso interessante da evolução e das descobertas da medicina e da ciência, porque, durante muito tempo, a tosse convulsa era considerada uma doença de crianças. Portanto, a vacina era dada na infância. Não havia, que se tivesse conhecimento, a necessidade de qualquer reforço dessa vacina, [apenas] casos excecionais, provavelmente. Neste momento, há evidência que a tosse convulsa pode ser gravemente lesiva do aparelho respiratório de pessoas que já têm fragilidades respiratórias, como é o caso dos doentes DPOC. E, portanto, normas internacionais, que fazem parte de um consenso científico do tratamento da DPOC, aconselham que quem tem DPOC faça um reforço da vacina da tosse convulsa, ou seja vacinado, no caso de não ter sido na infância.

HN- No plano nacional de vacinação, a vacina contra a tosse convulsa é recomendada em cinco doses aos 2, 4, 6 e 18 meses e aos 5 anos. A recomendação que a GOLD (Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease) apresenta envolve outros grupos etários?

IS- Em relação à vacinação, é uma das mais eficazes, senão mesmo a mais eficaz intervenção em matéria de saúde pública. Prevenir a doença, e prevenir a doença a um custo muitíssimo baixo, tanto para os orçamentos como para as sociedades, é um valor extraordinário da vacinação. A Organização Mundial da Saúde, nesta semana da vacinação, recomenda muito isso, que se incentive a utilização de vacinas e se quebrem as barreiras do acesso à vacinação, precisamente por este facto extraordinário: ser uma intervenção em saúde pública extraordinariamente custo-efetiva.

Por outro lado, em relação à vacinação, também se tem assistido, nos últimos anos, à evolução ou à chamada de atenção para o facto que a vacinação não é só na infância, mas também é na juventude, na idade adulta e nos próprios mais velhos, como forma de proteção de um conjunto de doenças infeciosas. Este conceito de vacinação ao longo da vida é muitíssimo importante porque protege nas várias faixas etárias, protege as pessoas contra doenças que, em muitos casos, podem provocar sequelas muito graves e, nalguns casos, mesmo a morte. Portanto, o conceito de vacinação ao longo da vida é um conceito a que devemos estar todos atentos, e os planos nacionais de vacinação devem também contemplar essa vertente. Isto é, não são só as crianças ou os mais jovens, mas também toda a população deve ter uma boa cobertura vacinal.

HN- Em que grupos de doentes com DPOC é que a vacina contra a tosse convulsa é mais urgente?

IS- Na DPOC, nós temos quatro grupos de pessoas, conforme a gravidade e a intensidade da doença e tem a ver também com o facto de durante um ano, ou durante o ano anterior, terem tido sintomas mais agudos da doença. Portanto, naturalmente, num conjunto de pessoas, se há algumas que têm uma DPOC mais ligeira e outras têm uma DPOC mais grave, temos de começar por quem tem DPOC mais grave, embora toda a DPOC seja uma doença crónica grave e que, ao longo dos anos, se vai aprofundando – não para, não há cura. Os medicamentos que existem neste momento ajudam a uma boa qualidade de vida, a respirar melhor, as vacinas previnem infeções graves, mas não há uma cura efetiva da DPOC, independentemente do grau em que cada pessoa estiver.

HN- São conhecidos dados de incidência da DPOC em Portugal?

IS- São cerca de 800 mil pessoas.

HN- Qual é o papel de associações como a Respira na sensibilização para as necessidades dos doentes com DPOC?

IS- A chamada de atenção e a defesa do acesso aos cuidados de saúde. Eu acho que a palavra que pode definir em termos gerais o nosso trabalho é “acesso”. Acesso à prevenção, isto é, a vacinação – a vacinação da tosse convulsa, a vacinação da pneumonia, a vacinação da gripe -, a sessão tabágica; o acesso ao diagnóstico precoce, que é muito importante, que é um dos grandes problemas que as pessoas com DPOC têm – muitas vezes, quando efetivamente é feito o seu diagnóstico, já estão muito avançadas na doença; depois, o acesso a tratamentos efetivos; e dentro dos tratamentos efetivos, o acesso à reabilitação respiratória.

Portanto, tudo somado, o que nós defendemos é o acesso das pessoas com DPOC aos cuidados de saúde nos vários estádios desses cuidados: a prevenção, o diagnóstico precoce, o tratamento, a reabilitação e uma melhor qualidade de vida, naturalmente.

Começa a ter muita dimensão a qualidade do ar interior e exterior. Muitas vezes, nas casas, a humidade, o frio excessivo, o calor excessivo pode provocar, e provoca, graves danos na saúde respiratória das pessoas.

Alertar, chamar a atenção, pôr o foco, desenvolver comunicação nessas áreas, esse é o nosso trabalho.

HN- Que atividades desenvolvem na Respira?

IS- Basicamente são estas que eu acabei de lhe dizer.

90% das pessoas com DPOC são ex-fumadores. Portanto, é preciso, sempre, não deixar cair a luta do tabaco. Com a pandemia, as consultas de sessão tabágica praticamente desapareceram do Serviço Nacional de Saúde, assim como a reabilitação respiratória. Isso é motivo de grande preocupação. A mistura de uma infeção respiratória, por vírus respiratório, como é o Covid, com o tabaco é absolutamente explosiva, e as pessoas deviam ser alertadas para este facto, e devia ter havido sempre e em permanência, a par de toda a informação, uma nota: não fume; se fuma, deixe de fumar; socorra-se dos seus profissionais de saúde. Mas, enfim, isso não aconteceu. E preocupa-nos muito, porque deixar de fumar é o primeiro passo para alguma estabilização em quem tem DPOC.

O tabaco é um conjunto de substâncias altamente tóxicas e muito agressoras das vias respiratórias. Nós achamos que os pulmões foram feitos só para receber ar puro, não para receber qualquer espécie de substância que não seja ar. É a única maneira dos pulmões poderem funcionar. Portanto, a urgência de retomar essas informações sobre o tabaco é grande, porque tabaco e Covid é realmente uma mistura explosiva.

A reabilitação respiratória também é muito importante, não só para as pessoas que têm DPOC, mas também para todas aquelas, e suspeitamos que são bastantes, que têm sequelas do Covid, que se prolongam nalguns casos por muito tempo e que precisam desesperadamente de reabilitação respiratória. É outra questão que está a emergir e para a qual devemos dedicar toda a nossa atenção.

O número de pessoas que têm acesso [a reabilitação respiratória] está reduzido em cerca de 30%. Com as normas da Covid-19, das distâncias, da desinfeção das salas, de tudo isso, a capacidade de atendimento está reduzida em cerca de 30%. Há aqui uma situação muito preocupante e altamente penalizadora para os doentes.

HN- Quais são, neste momento, as maiores preocupações da Respira relativamente ao acompanhamento dos doentes com DPOC? Estão relacionadas com a pandemia de Covid-19?

IS- As nossas preocupações é que os doentes com DPOC, em primeiro lugar, saibam quando, como e onde vão ser vacinados. Simultaneamente (é muito difícil pôr uma hierarquia porque elas são todas importantes), é muito importante que os doentes com DPOC mantenham o seu tratamento durante a pandemia, durante a vacinação, durante todo o tempo. O terceiro aspeto que para nós é muito importante é que os doentes percebam e consigam ir aos seus tratamentos, aos seus centros de saúde, aos seus hospitais, porque já é seguro. As pessoas ainda têm muito medo, nomeadamente os doentes respiratórios. Mesmo que tenham algum receio, falem com os profissionais de saúde. Peçam ajuda. Se lhes for oferecida uma teleconsulta, aceitem essa teleconsulta. Não é exatamente a mesma coisa, nós sabemos, mas é um amparo, é uma forma de as pessoas se sentirem apoiadas e ajudadas. Como sabe, os doentes crónicos precisam de cuidados de saúde permanentes e regulares. Tem que haver aqui uma regularidade, senão os doentes crónicos descompensam e entram em sofrimento. E é precisamente para estes aspetos que nós alertamos os nossos associados, as pessoas com DPOC e as autoridades de saúde em geral.

 

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