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Ana Rosa Costa: “Ainda se pode fazer mais e melhor” no planeamento familiar em Portugal

A desvalorização das consultas de planeamento familiar acarreta “maior risco de gravidez não planeada e não desejada” e “de infeções sexualmente transmissíveis não prevenidas, não diagnosticadas e não tratadas atempadamente”, explicou ao HealthNews a Dr.ª Ana Rosa Costa, assistente hospitalar graduada de ginecologia e obstetrícia do CHU de São João, no Porto, e vice-presidente da Sociedade Portuguesa da Contraceção. Por isso, todas as mulheres com atividade sexual e que necessitam de contraceção devem recorrer a estas consultas. Segundo a médica, apesar de Portugal se encontrar “numa boa posição a nível europeu”, pode-se “fazer mais e melhor” nesta área.

HealthNews (HN)- Qual a importância das consultas de planeamento familiar?

Ana Rosa Costa (ARC)- É importante o aconselhamento para que as mulheres possam iniciar (ou mudar para) o método contracetivo mais adequado às suas necessidades, podendo obter alguns benefícios não contracetivos e melhorar o seu estado de saúde, evitando, assim, o risco de uma gravidez não planeada. A consulta de planeamento familiar destina-se a fornecer informação e aconselhamento contracetivo correto, e de forma clara, para que a mulher possa optar pelo método que melhor se adapta às suas necessidades e expetativas, permitindo-lhe planear quando e quantos filhos quer ter. A consulta de planeamento familiar constitui também uma oportunidade para informação e rastreio de infeções sexualmente transmissíveis.

HN- Quando é que se deve recorrer às consultas de planeamento familiar?

ARC Todas as mulheres com atividade sexual e que necessitam de contraceção, independentemente da idade, devem recorrer à consulta de planeamento familiar. Só assim conseguiremos garantir às mulheres o direito a uma vida sexual saudável e segura, evitar a gravidez não planeada nem desejada e, consequentemente, o recurso à interrupção voluntária da gravidez.

HN- Quais são os riscos da desvalorização destas consultas?

ARC A desvalorização e não frequência das consultas de planeamento familiar acarreta, por um lado, maior risco de gravidez não planeada e não desejada, nomeadamente de gravidez na adolescência. Por outro lado, implica maior risco de infeções sexualmente transmissíveis não prevenidas, não diagnosticadas e não tratadas atempadamente, que podem ter consequências na fertilidade futura e, também, riscos para a saúde, pela opção por métodos não adequados ou por falta de informação correta.

HN- Em Portugal, quem frequenta mais estas consultas?

ARC Apesar de ser frequentada por mulheres desde a adolescência até mulheres na peri-menopausa, a minha perceção é de que a consulta é frequentada sobretudo por mulheres que já tiveram filhos e mulheres com relações estáveis.

HN- Quais os grupos populacionais que beneficiam mais destas consultas?

ARC Todos os grupos populacionais têm benefícios ao frequentar esta consulta, de forma a escolherem o método que mais se adequa às suas necessidades. Na consulta de planeamento familiar, os riscos e benefícios dos diferentes métodos disponíveis são avaliados de forma individual para cada mulher, abordando questões relacionadas com valores (incluindo a aceitação de uma gravidez não planeada em caso de falha do método), crenças, frequência de administração do método ou questões económicas (no caso de contracetivos não comparticipados). Esta decisão informada e partilhada entre médico e utente irá permitir uma aceitação e maior adesão ao método, reduzindo a taxa de gravidez não desejada. As mulheres podem também usufruir dos benefícios não contracetivos da contraceção hormonal, como a regularização dos ciclos menstruais, diminuição do risco de anemia, de cancro do endométrio e do ovário, melhoria da acne e das dores menstruais.

HN- Há grupos mais reticentes?

ARC De acordo com o último estudo das práticas contracetivas em Portugal, as adolescentes procuram informação, sobretudo, nas redes sociais e entre amigas. Sendo este grupo o mais vulnerável e atendendo aos custos da gravidez na adolescência e ao impacto negativo a nível pessoal, familiar e social, é de extrema importância a educação sexual e o aconselhamento contracetivo na adolescência, devendo incluir o género feminino e masculino.

HN- O impacto da Covid-19 nesta área foi muito prejudicial? Quais as principais repercussões da pandemia?

ARC Apesar de a pandemia ter alterado muitas das práticas de cuidados de saúde, não alterou a necessidade de uma contraceção segura e eficaz. Muitos hospitais adiaram a esterilização cirúrgica, verificou-se uma diminuição no acesso aos métodos contracetivos reversíveis de longa duração e de maior eficácia (dispositivos intrauterinos e implantes) e ficaram muitas dúvidas por esclarecer. Em termos de percentagens, só em 16% dos casos não foram afetados os serviços e em 35% houve diminuição da atividade. As consultas presenciais, durante a pandemia, ficaram muito limitadas, pelo que é importante implementar, ou expandir, métodos que aumentem o acesso à contraceção, nomeadamente com consultas não presenciais. Apesar de desafiante para as consultas de ginecologia, porque não permite o exame ginecológico, o formato não presencial pode permitir, de forma eficiente, a prescrição de métodos contracetivos, como a pílula, o anel vaginal ou o adesivo, bem como pode ser útil para aconselhamento e prescrição de contraceção de emergência.

HN- Os serviços essenciais têm sido assegurados durante a pandemia?

ARC A necessidade de restruturação dos serviços a nível de cuidados primários e a nível hospitalar levou a que muitas consultas ficassem por marcar ou realizar e que cirurgias fossem adiadas, mas houve sempre um esforço para que os serviços essenciais fossem assegurados.

HN- Considera que os portugueses reconhecem a importância das consultas de planeamento familiar?

ARC O reconhecimento da importância das consultas de planeamento familiar pelos dirigentes políticos com legislação específica, a implementação de consultas e o fornecimento de métodos contracetivos de forma gratuita colocam Portugal numa boa posição a nível europeu. Contudo, ainda se pode fazer mais e melhor, nomeadamente a nível da população geral. É importante a divulgação da importância desta consulta e a promoção de acesso rápido e equitativo a estes cuidados de saúde a nível nacional, uma vez que ainda se registam muitas discrepâncias.

Entrevista de Rita Antunes/MM

 

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