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Atrair e fixar médicos no SNS. “É nas áreas da investigação e dos projetos de carreira que temos de evoluir”

Que lições considera que temos, enquanto sociedade, a retirar desta pandemia?

Inúmeras. Somos uma raça bastante mais vulnerável do que aquilo que pensávamos. Também somos capazes de reagir a ameaças de uma forma mais premente do que pensávamos. Por outro lado, conseguimos mostrar que temos um SNS robusto e resistente, capaz de se submeter a grandes pressões.

Considera que têm de ser feitas correções no SNS para enfrentar uma possível nova pandemia no futuro? O que pode mudar?

Pode mudar a nossa capacidade de reagir, [no sentido] de sermos pró-ativos, antes de reativos. Pode mudar o facto de termos de cooperar com outras instituições. Veja a cooperação que houve com as autarquias, a proteção civil, as forças de segurança.

 

 

É preciso pensar numa reorganização e reforço dos cuidados hospitalares?

Os cuidados hospitalares evoluíram muito. Chegámos até às 19 mil camas e até às 900 camas em unidades de cuidados intensivos (UCI). Antes da pandemia, tínhamos uma capacidade de 6,2 camas por 100 mil habitantes, hoje estamos com 9,4 – ao nível da OCDE. Mais do que duplicámos a capacidade em UCI. Tínhamos 1142 ventiladores no início da pandemia e hoje temos mais de dois mil. Isto para não falar no reforço de recursos humanos em todo o SNS. Só no ano de 2020 e no início de 2021 temos mais 13 mil profissionais. E são mais de 29 mil em relação a 2015.

 

Pandemia. “Não fizemos tudo bem. Se soubesse que a variante Delta estaria à porta no Natal, não teria feito [a abertura]”

 

Esse acréscimo de profissionais é o valor líquido?

Sim, são saldos líquidos. Estamos a falar de mais seis mil médicos e mais dez mil enfermeiros.

Consegue apontar o maior erro que considera que o governo cometeu durante esta pandemia e de que agora se arrependa?

Não fizemos tudo bem. Tomámos as decisões com base em informações que tínhamos. A maioria das decisões foram certas e tomadas no tempo certo. Olhando para trás, se soubesse que a variante Delta estaria à porta no Natal, não teria feito [a abertura]. Depois, apareceu a variante Delta, durante um período de maior mobilidade, o que resultou na terceira onda.

Suspensão da atividade não-covid. “Reconheço que foi uma decisão que poderá ter custos”

 

Esta pandemia prejudicou a atividade assistencial nos cuidados de saúde primários (CSP), o que fez diminuir os diagnósticos de doenças como o cancro. Poderia ter sido feito algo mais para não deixar para trás os doentes não-covid?

Todos os países da Europa tiveram de suspender a atividade em função da covid-19. Reconheço que a decisão que tomámos poderá ter custos. No entanto, estamos a progredir de uma forma bastante acelerada. Estamos, hoje, praticamente em linha com a atividade assistencial de 2019, no período pré-pandemia. O total de consultas até ao mês de agosto de 2021 é de 24 milhões, mais três milhões do que em 2019, no mesmo período. Estamos a recuperar. Nos hospitais, já foram feitas 8,1 milhões de consultas até agosto, mais 24 mil do que em 2019.

 

O governo já falhou por várias vezes o objetivo de atribuir um médico de família (MF) a todos os portugueses. Ainda é possível fazê-lo até final desta legislatura, em 2023?

Temos essa ambição. Em 2015, pegámos num SNS com 1,3 milhões de pessoas sem MF. Em 2020, estávamos com 700 mil e agora estamos com 1,1 milhões. Este ano, das 459 vagas de Medicina Geral e Familiar (MGF) a concurso, cerca de 220 vagas foram preenchidas, o que poderá dar MF a 400 mil utentes. Estamos novamente numa fase de recuperação.

O que justifica que o número de população a descoberto (sem MF atribuído) tenha voltado a aumentar?

Há várias razões. Por um lado, houve mais inscrições no SNS – mais 95 mil. Outro fator tem a ver com a heterogeneidade do nosso território. No Norte, temos uma cobertura completa de MF, enquanto que em Lisboa e Vale do Tejo (LVT) temos uma cobertura de 86% [há 745 mil doentes a descoberto nesta região]. É a região mais difícil e onde estamos a fazer um esforço grande.

 

“Estamos a ponderar [um novo regime de exclusividade] de acordo com critérios, metas e objetivos”

 

O governo tinha também o objetivo de colocar um médico dentista em cada um dos agrupamentos de centros de saúde (ACES) do país até 2020. A Ordem dos Médicos Dentistas fala num falhanço “em quase toda a linha”. Como está esse processo?

O processo tem evoluído bem. Os dentistas precisam do equipamento para o seu trabalho. É verdade que não temos a cobertura que gostaríamos de ter.

O governo tem alguma estratégia/plano para reter e atrair médicos para o SNS?

Esta geração de médicos é muito qualificada e necessita de novos projetos, nomeadamente na área da investigação. É fundamentalmente nesta área que temos de evoluir. É claro que as condições remuneratórias são importantes, mas também o é dar condições de trabalho e projetos de carreira.

Isso está a acontecer? Os médicos dizem que têm melhores condições de trabalho no setor privado.

O setor público tem melhorado muito. O trabalho em equipa, de projeto, é um trabalho que o sistema público pode dar.

 

 

O governo mantém-se firme na intenção de avançar com um novo regime de exclusividade para os médicos?

Essa é uma discussão que deve ser feita com base no estatuto do SNS. Têm de haver novos processos no que diz respeito à dedicação plena. Devem ser processos progressivos, graduais, por opção e de acordo com critérios, metas e objetivos. Podemos começar por centros de responsabilidade integrada, por direções de serviço ou por outros segmentos.

É isto que estamos a ponderar neste momento, de modo a irmos pisando este terreno de uma forma firme, para que não haja depois retrocessos.

 

“Os médicos têm uma lista de reivindicações muito grande”

 

Esse novo regime pode entrar em vigor já em 2022?

Não lhe posso adiantar. O período de pandemia não era o período adequado para se falar neste assunto. Agora é o momento adequado para começar a ponderar esta matéria.

Os sindicatos médicos, tanto a FNAM como o SIM, acusam o governo de nem sequer mostrar vontade de reunir e negociar. O governo está de má-fé no diálogo com os sindicatos?

Não. O governo nunca está de má fé. Temos de governar com os recursos que temos e em função e defesa dos nossos profissionais e dos utentes. Todos os meses – ou com muita regularidade – reunimos com o SIM e com a FNAM. Até lhe posso dar as datas das reuniões que tenho tido com eles. A prova de que houve diálogo é que tivemos paz social ao longo deste período [da pandemia].

Em que é que se traduziu esse diálogo? O governo está disposto a atender a alguma das reivindicações dos médicos?

As agendas são muito diversas. Os médicos têm uma lista de reivindicações muito grande, desde reivindicações salariais, até projetos de carreira, entre outras. Nós vamos acompanhando, reconhecendo algumas das situações em que têm razão e em que vamos progredindo. Agora, temos de fazer uma gestão equilibrada.

Os médicos têm falado na questão da dedicação plena e nos concursos. Abrimos o maior número de vagas de sempre [para a colocação de médicos].

No entanto, muitos desses lugares ficam vazios, sem candidatos, o que é, de resto, um problema que se arrasta há anos. Como é que tencionam resolver essa questão?

O não preenchimento das vagas nos concursos depende de vários fatores. Na região Norte, é muito mais fácil captar os médicos do que em LVT e no Algarve. Os serviços que têm projetos, que são apelativos, que têm criatividade, conseguem reter recém-especialistas. O que estamos a fazer é um esforço para que os serviços menos apelativos criem esses projetos e possam reter os profissionais.

 

“A urgência faz parte do horário. Os médicos podem gostar ou não gostar, mas têm de fazer todo o tipo de trabalho”

 

No pós-verão, sucedem-se os relatos de longas filas de espera nas urgências de vários hospitais, por falta de médicos nas escalas. Como olha para este problema?

Trabalhei no hospital de Leiria, onde fazia várias urgências por semana, por vezes. Sempre tive filas de espera e sempre fomos resolvendo os problemas. O grande segredo é uma boa articulação entre os CSP e os cuidados hospitalares. Existem vários projetos-piloto nessa área e, nesses locais, as coisas fluem de forma tranquila. 40% das pessoas que recorrem a urgências recebem pulseiras verdes ou azuis, situações que poderiam ser resolvidas nos centros de saúde.

No entanto, reconhece que a urgência não é atrativa para os médicos? É necessário criar incentivos, é necessário criar a especialidade de Medicina de Urgência, por exemplo?

A urgência faz parte do horário médico, é uma das componentes do trabalho médico. Os médicos podem gostar ou não gostar, mas têm de fazer todo o tipo de trabalho. Em relação às equipas profissionalizadas [de urgência], estamos a aguardar aportes de informação e estamos a ponderar essa hipótese. Mas, neste momento não está nada determinado.

Qual é a posição do Ministério da Saúde no que diz respeito à possibilidade de se aumentarem as vagas para formação nas faculdades de Medicina ou de criar novos cursos?

Não me quero prenunciar. Deixo isso para o Ensino Superior e para a Ordem dos Médicos (OM). A nós cabe-nos gerir os recursos que temos. O papel que temos é após cada médico ter tirado o seu curso. O que queremos é que os cursos tenham qualidade.

 

Aumento de vagas em medicina? “A capacidade formativa dos tem de ser adequada. Isso preocupa-me”

 

Mas a capacidade formativa dos hospitais teria de se adequar a esse possível aumento das vagas. Isso preocupa-o?

Preocupa-me. Acho que a capacidade formativa tem de ser adequada. Quando abrimos um concurso pedimos as vagas e cabe à OM indicar qual é a capacidade formativa. Essa capacidade tem vindo a aumentar e a prova disso é que abrimos o maior número de vagas de sempre.

A vacinação contra a gripe já arrancou. Tem a expectativa de que mais portugueses se vacinem este ano?

Se isso acontecer, estaremos a proteger-nos. Temos 2 milhões e 240 mil vacinas, isto é, mais 146 mil doses do ano passado. Antes da pandemia, apenas 20% dos profissionais de saúde aderiam à vacina, no ano passado tivemos uma adesão de 60%. As farmácias vão vacinar 200 mil pessoas, acima dos 65 anos, gratuitamente, tal como fizemos em 2020.

Neste momento, temos de manter ainda os centros de vacinação de grande porte porque poderemos ter que vacinar entre 60 a 80 mil pessoas por dia [com vacinas contra a covid-19 e contra a gripe].

Depois do desgaste a que foi sujeita, a equipa do Ministério da Saúde tem condições para continuar?

Claro, e estamos motivados. Mas, isso só depende da vontade do Sr. Primeiro Ministro.

TC/SO

Fonte: Saúde Online

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