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Francisca Delerue: “A Hospitalização Domiciliária é uma solução para aliviar a pressão no SNS”

Healthnews (HN) – A 3 e 4 de junho realiza-se o 2º Congresso Nacional de Hospitalização Domiciliária. O que se pode esperar deste encontro?
Francisca Delerue (FD): Este congresso vai ser importante em termos de partilha de conhecimento. Devido à pandemia de COVID-19 estivemos mais afastados e com reuniões feitas online. Como o congresso vai ser híbrido, um dos pontos fortes vai ser a participação presencial, haverá por certo mais comunicação e troca de conhecimentos.

HN – Quais as temáticas principais que vão estar em destaque neste encontro?
FD – Vamos falar da evolução da Hospitalização Domiciliária em Portugal e de o crescendo cada vez maior no que respeita a esta modalidade de internamento. Iremos também falar de um outro ponto que tem que ver com a Antibioterapia pois temos um grande número de doentes com patologia infeciosa. Falaremos da antibioterapia, dos cuidados envolventes, protocolos e da segurança desse tratamento. Por outro lado, falaremos também de outras patologias mais frequentes que são a parte respiratória, a reabilitação, a oxigenoterapia e a patologia cardiovascular – também muito ligada à parte da diabetes, hipertensão e da Insuficiência cardíaca. Uma das principais mais valias da Hospitalização Domiciliária é o poder estar em casa do doente e a, consequente, reconciliação terapêutica, isto é, conseguirmos que os doentes adiram mais à terapêutica e tomem conhecimento das suas doenças – isto é realmente vantajoso.

HN – Outros temas vão marcar o congresso.
FD –
Sim, falaremos da HD no campo dos cuidados paliativos. Nesta mesa-redonda vai haver intervenção ativa de cada um dos principais profissionais que são os médicos, enfermeiros e o serviço social.

Os Cuidados Paliativos é uma área onde estão cada vez mais a pedir-nos apoio, todos os hospitais têm equipas de suporte em cuidados paliativos. Muitas vezes sucede que estes doentes estão internados por agudização e pedem e preferem estar em casa, e é realmente isso que estamos cada vez mais a conseguir.

Cada vez mais as equipas de HD têm elementos que fazem parte dos cuidados paliativos, e isto tem sido uma mais-valia para estas equipas e, claro, sobretudo para o doente. Estamos a conseguir que muitos destes doentes façam o seu internamento e agudização em casa e, às vezes em fim de vida em que é preciso um apoio mais próximo, e se possível 24 horas sob 24 horas, só equipas de HD conseguem esse tipo de apoio.

HN – Quais os ganhos que a HD representa para o doente?
FD – Para o doente – e isso já está bem documentado e é também o que nos indica a nossa experiência – um dos ganhos, o qual é muito referenciado, tem que ver com as infeções. Quando está em casa não apanha. Muitas vezes, o doente é internado por motivo de uma patologia e depois os internamentos prolongam-se porque de repente teve uma infeção respiratória ou urinaria, tudo decorrente de infeções que podem adquirir no hospital.

Há depois um outro ponto importante que tem que ver com os doentes idosos. Como já têm algum grau de dependência chegam ao hospital e ficam acamados e perdem a pequena autonomia que tinham porque rapidamente perdem massa muscular, mas em casa não. Lá continuam a manter a sua vida como faziam, levantam-se na mesma, há um incentivo para isso, há um incentivo da família. Refira-se que na HD a família é envolvida no cuidado do doente e no hospital as famílias ficam alheadas, porque estão longe e só vão buscar o doente no momento da alta, e, quando isso acontece, ele está mais dependente. É, nessa altura, que surgem os problemas sociais. ‘Ele está mais dependente e eu assim não o consigo levar para casa’. Há um outro ponto importante ainda no que toca aos doentes idosos: quando saem do seu ambiente, têm quadros confusionais agudos durante o internamento – o que não acontece quando permanecem em casa.

Por outro lado, já no que toca a doentes mais Jovens quando pomos a alternativa de irem para casa transmitem-nos que é isso que preferem – claro que só o fazemos quando se reúnem todas os critérios e condições. Estes doentes Jovens, refira-se, são doentes com quadros agudos, não são doentes crónicos. No que respeita à HD o grau de satisfação transmitido quer por doentes quer por familiares é elevadíssimo, não tivemos ainda nenhuma reclamação [risos].

HN – Quais os ganhos que identifica no que concerne ao Sistema Nacional de Saúde?
FD –
O que está a acontecer é que temos uma sobrelotação enorme dos hospitais, com o aumento de esperança média de vida as urgências estão sempre muito assoberbadas e cheias de doentes. O que considero que devemos fazer é que os hospitais têm de ficar reservados a situações graves. Muitos dos doentes que estão nos hospitais podem ficar em casa – temos é de criar condições para isso. O futuro vai ser este. Veja-se que doentes que estão na rede nacional em cuidados continuados, a maioria deles não precisa de estar no hospital. As equipas de HD têm de crescer para conseguir abarcar a todos eles.

HN – Qual o impacto da HD em termos de número de camas e doentes tratados?
FD –
De 2020 para 2021 houve um grande aumento de número de doentes tratados e número de unidades. Temos 36 unidades do SNS e uma unidade privada que é da CUF.

No final de dezembro tinham sido tratados já em HD 16.183 doentes, em 2020 foram tratados 4.830 e, em 2021, foram 7.253, aqui nota-se, de um ano para o outro, um aumento imenso. Isto corresponde, em 2020 a cerca de 215 camas, e em 2021 corresponde a 300 camas diárias. Para quem duvida ou não aceita muito bem se a HD é benéfica ou não, deve pensar que 300 camas já corresponde a um hospital pequeno. E, pergunto, quais os custos inerentes a pôr a funcionar um hospital com 300 camas? Refiro ainda que temos uma demora média 9.7 dias.

HN – Num momento em que se assiste a uma carência de profissionais de saúde a nível nacional, terá Portugal capacidade de resposta e recursos humanos suficientes para expandir a rede de HD por todo o território? Ou terá inevitavelmente de haver um reencaminhamento de profissionais?
FD –
No período mais grave da pandemia de COVID-19, eu é que estava a gerir as enfermarias de Medicina, as enfermarias COVID e a UHD e, nessa altura, nós precisávamos de camas hospitalares, e eu tinha de tirar doentes do hospital. O que eu fiz foi deslocar médicos para a unidade de hospitalização domiciliária para aumentar a lotação, cheguei a ter 20 doentes COVID mais 10 doentes não COVID em casa, porque eram precisas camas no hospital para os doentes mais graves. Porém, sublinho, a maneira de os retirar também tinha de ter resposta. Sim, sem dúvida de que nos hospitais é preciso mais profissionais, mas os hospitais têm de organizar os profissionais que têm de acordo com as necessidades.

Neste momento, não consigo abrir mais camas porque nos faltam mais profissionais, mas temos de nos mexer para isso. Não chega apenas dizer: – “Se dentro do hospital não conseguimos, quanto mais para fora”. É preciso é haver uma recolocação de profissionais, isso é que é importante fazer.

HN – Considera que HD é uma solução para aliviar a pressão para o SNS?
FD –
Sim, sem dúvida. Por isso é que digo que os doentes que estão em lares e que vão ao hospital por motivo de infeções respiratórias ou urinárias podem ser tratados nos lares. Temos protocolos com alguns lares, e há uns com que realmente funciona muito bem.

Por outro lado, estamos a admitir cada vez mais doentes que ficam em casa. Os doentes não vêm ao hospital, são referenciados pelo Centro de Saúde ou outras unidades ou hospitais em que quando vão avaliar o doente constatam que a área de residência é de um outro hospital e contactam a área desse hospital. Tem havido esse intercâmbio. Nestas situações os doentes vão para casa, o doente nem passa pelo hospital. É, acima de tudo, preciso criar estruturas para que tal seja possível.

HN – É essencial que sejam criadas condições para esta expansão…
FD –
Sim. Por exemplo, em termos de famílias é complicado porque muitas vezes as pessoas trabalham, os doentes idosos não podem estar sozinhos e aí é preciso outra estrutura. Estamos a tentar nomeadamente com a Câmara de Almada ter uma bolsa de cuidadores que possa colmatar o período enquanto os familiares trabalham. A ideia será dar formação a esses cuidadores. Os doentes são bem tratados e com melhor qualidade e muito mais humanização.

HN – Em que se diferencia este tipo de internamento?
FD –
Na casa do doente, a equipa está em média cerca de 40 minutos com cada doente, nas enfermarias não há nenhum médico ou enfermeiro que esteja 40 minutos ao pé de um doente. O doente sente que tem um médico só para ele, há tempo para conversar, há tempo para fazer literacia em saúde, para os doentes perceberem a sua doença. É um tratamento muito mais humano e sendo em casa do doente há muito mais a adesão do doente e da família, que também é envolvida no tratamento do doente.

HN – Quais os principais desafios que se levantam para enfermeiro e médico na HD? O ambiente de casa não é uma enfermaria.
FD –
A equipa tem de ser experiente, os enfermeiros nunca podem ser recém-formados, sempre aceitámos enfermeiros já com alguma formação. Para a equipa este é um ambiente hostil pois sai do seu ambiente e vai para a casa do doente. O enfermeiro tem de ter alguma experiência, tem de saber o que fazer e dizer pois não tem ali a possibilidade de perguntar ao colega. Assim como os médicos tem de fazer formação para perceber como funciona – mesmo os enfermeiros fazem sempre formação quando entram para estas unidades. Isto faz criar um espírito de equipa muito grande, o médico e o enfermeiro acabam por ser uma equipa que é muito coesa. Eles saem de manhã e voltam à tarde e, portanto, estão o dia todos juntos. Já trabalhei em muitos serviços de medicina e nunca vi uma coesão tão grande, e a empatia que se cria em termos de equipa e funcionamento.

MG/HN

Fonte: Lifestyle Sapo

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