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António Branco: transformar todas as unidades dos CSP em USF modelo B até ao final do ano… “só com trafulhice”

Healthnews (HN) Como olha para esta renovada “tendência” de organização dos cuidados em Unidades Locais de Saúde (ULS)?

António Branco (AB) Foi uma moda. Algumas funcionam bem… Já outras funcionam exatamente como funcionavam antes. No caso da ULS de Matosinhos, foram criados centros de saúde e construído um hospital novo. Isto tudo no tempo de Correia de Campos. Os resultados que vinham sendo obtidos eram melhores comparativamente a Viana do Castelo, mas a diferença é que em Matosinhos tudo tinha sido feito de raiz… Não foi pelo modelo.

Em Lisboa houve sempre uma oposição à criação de ULS. Foi propagandeado que os conselhos de administração dos hospitais passavam a “comandar” também os centros de saúde e que no caso de surgirem problemas de falta de médicos nas urgências… iam-se buscar aos centros de saúde.

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HN – Precisamente os centros de saúde que iriam integrar a então nova ULS de Matosinhos chegaram a considerar que essa questão poderia constituir um potencial perigo, mas a verdade é que esses receios nunca se vieram a concretizar?

AB – A ULS de Matosinhos não é um bom exemplo… Nesta região foi tudo feito de raiz. Foi o único sítio onde isto aconteceu. Se se fizesse o mesmo noutras regiões (novos centros de saúde, hospitais e profissionais de saúde) o sistema iria funcionar bem. Portanto, Matosinhos foi utilizado como modelo para demonstrar que as ULS eram algo “bom”, mas não é verdade.

Daquilo que tenho lido, os resultados obtidos devem-se ao facto de em Matosinhos terem sido contratados novos profissionais de saúde e construídas novas infraestruturas. Se não fosse uma ULS, aquilo funcionaria bem à mesma.

HN – Em entrevista ao nosso jornal, o Presidente da USF-AN afirma ser possível ter quase 90% da população coberta por USF até ao final de 2023, sendo que a passagem para modelo B seria alargada às UCSP. Isso é possível?

AB – É, mas com trafulhice… A lei dita que para que possa ser feita essa passagem é preciso que sejam cumpridos certos parâmetros de desempenho.

HN – No início de janeiro, o Ministério da Saúde anunciou que até 30 de junho deste ano transitam para Unidades de Saúde Familiar (USF) modelo B um total de 28 unidades. Qual a leitura que faz desta decisão?

AB – Antigamente não era feito assim, mas de há uns anos a esta parte é-o, por causa do Orçamento de Estado.

HN – O despacho diz que até 31 de janeiro vai ser fixado o número total de USF, mas não faz referência ao modelo B…

AB – Em princípio o despacho deveria indicar o número de USF modelo B.

HN – Mas não foi o caso

AB – Não. Fala apenas nas USF.

HN – Considera que as USF modelo A são uma versão “mitigada” ou existem apenas porque não há dinheiro para promover a passagem para modelo B?

AB – Há um problema nas USF. Estas formam-se apenas se existirem pessoas para as fazer. Portanto, termos despachos a anunciarem que vai haver vinte ou trinta novas USF não vale nada porque se não houver determinado número de médicos e enfermeiros não é possível haver novas unidades de saúde.

HN – Segundo aquilo que foi dito pelo Ministro um número alargado de USF modelo A vai passar de forma automática para o modelo B

AB – Mas isso nunca aconteceu. E porquê? Porque é uma medida com elevado impacto orçamental. Ter mais USF modelo B significa uma despesa maior.

Podia-se ter feito um estudo para que o impacto orçamental não fosse tão violento. Isso não foi feito. Não houve um estudo que avaliasse que correções se deveriam introduzir para que esta medida fosse viável.

HN – Relativamente às condições remuneratórias, o despacho indica que irá ser feita uma reavaliação

AB – Se o caminho passar pelo controlo das horas de trabalho das equipas então mais vale não reavaliar nada.

HN – Do seu ponto de vista, a que nível é que deveriam haver alterações no decreto de lei?

AB – É preciso definir os critérios mínimos de resultados para uma USF poder ser classificada modelo B. Quando se produziu o primeiro decreto sobre a criação destas unidades, na altura do Correia de Campos, foi tudo feito à pressa. Foi uma ideia geral e nunca mais ninguém mexeu naquilo. As poucas coisas em que se mexeu foi para “abandalhar”.

Se soubesse o que sei hoje teria defendido ainda mais escalões de USF e não só as As e as Bs – a melhores desempenhos corresponderiam melhores remunerações. Infelizmente, na altura, isso era muito mal visto politicamente.

HN – Como se explica que ainda se mantenham USF modelo B que não cumprem os critérios básicos?

AB – Por inércia. A fragilidade das avaliações continua a ser tal maneira grande que dá nisso.

HN – Daquilo que se depreende da lei é que quando as regras definidas no modelo B não são cumpridas estas desparecem, voltando os médicos para o modelo A

AB – A única maneira de extinguir uma USF é por falta de um coordenador. O que é que isto criou? Que um centro de saúde que ainda não está em USF seja considerado uma UCSP.

HN – Mas as UCSP têm uma carga de trabalho maior do que as USF modelo B

AB – Sim e têm listas de utentes enormes, mas até agora ninguém fez nada para alterar isso.

HN – Passados mais de 15 anos desde o início da reforma, acredita que ainda é possível fazer alterações sem que haja uma revolta de algumas equipas?

AB – É possível. Nos últimos quinze anos houve várias tentativas para melhorar o funcionamento das unidades de saúde.

HN – Recentemente foi alargado o horário de funcionamento das unidades de cuidados de saúde primários para evitar o recurso aos serviços de urgência hospitalar, tendo o presidente da APMGF dito que esta medida estava a ter pouco impacto naquele que seria o objetivo do Governo.

AB – Claro que não tem impacto. Ao longo dos anos foi criada esta ideia de que as urgências hospitalares estão sob pressão devido à falta de resposta dos centros de saúde. É verdade que é difícil que os hospitais respondam bem aos doentes se os cuidados primários responderem mal, mas é igual se for ao contrário.

Penso que esta ideia foi criada para arranjar explicações que não fossem penalizadoras. Há hospitais a funcionar de uma forma totalmente desorganizada.

Por outro lado, a expansão da rede hospitalizar privada precisa das carências da rede pública, que é fagocitada, para solidificar os progressos que tem tido.

HN – Estima-se que este ano saiam cerca de 500 médicos de família se aposentem. Trata-se de um cataclismo?

AB – Em 1982 entraram menos de 200 novos alunos nas escolas médicas com 500 médicos a aposentarem-se . Só mais tarde é que este número começou a aumentar. De facto, o pessoal médico na casa dos 50-60 anos praticamente não existe. Temos profissionais mais novos ou mais velhos.

HN – E como é que esta situação vai ser resolvida? É com o tempo?

AB – Sim. À medida que o tempo vai passando este fosso vai diminuindo. Mas foi um erro de planeamento. Entre entrar para o curso e sair para o mercado de trabalho são precisos muitos anos.

Trata-se de um problema geracional. Apesar de ter aumentado a idade da reforma, há muitos médicos com idade avançada.

HN – Atualmente temos um Diretor-Executivo do SNS. Considera que este novo órgão irá resolver os problemas que o sistema enfrenta?

A ideia está bem concebida e é positiva, mas se não tem autoridade a nível financeiro e de recursos humanos corremos o risco de ser só folclore. Tenho dúvidas de que funcione bem.

HN – Ainda ninguém sabe o que vai acontecer às ARS…

AB – Se o Diretor-Executivo do SNS conseguir realmente fazer melhor, as Administrações Regionais de Saúde desaparecem. Se isso não acontecer então as ARS vão continuar a tapar os buracos que ninguém consegue tapar.

Entrevista de Miguel Múrias Mauritti

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Fonte: Lifestyle Sapo

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