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Surto pós-pandêmico de fungo resistente a medicamentos no Brasil decorrente de abuso de medicamentos e UTIs lotadas

Surto pós-pandêmico de fungo resistente a medicamentos no Brasil devido ao abuso de medicamentos e UTIs lotadas

Árvore geradora mínima de isolados de C. parapsilosis. Crédito: Micróbios E Infecções Emergentes (2022). DOI: 10.1080/22221751.2022.2117093

No Brasil, um grupo de pesquisadores relatou o maior surto até o momento de candidemia associada à COVID causada pela mesma cepa resistente a medicamentos de Candida parapsilosis, um fungo que invade a corrente sanguínea e pode levar à morte. O surto ocorreu em 2020-21 em uma unidade de terapia intensiva (UTI) de um hospital terciário de referência em Salvador, Bahia, durante um dos picos da pandemia de COVID-19.

Em artigo publicado na revista Micróbios E Infecções Emergentesos pesquisadores alertam para a possibilidade de que outras cepas resistentes a medicamentos surjam no futuro e destacam a importância de práticas que ajudem a evitar infeções fungais em hospitais.

“Fizemos um estudo no qual analisamos amostras de sangue de pacientes graves com COVID-19 no hospital e descobriu que 90% dos infectados por essa espécie de Candida tinham cepas resistentes ou tolerantes a fluconazol e equinocandinas, as duas principais classes de antifúngicos usadas no tratamento de candidíase invasiva. Quase 60% desses pacientes morreram”, disse Arnaldo Colombo, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) e principal pesquisador do estudo.

Os pesquisadores analisaram 60 isolados cultivados de 57 pacientes que desenvolveram candidemia por C. parapsilosis na UTI COVID-19 do hospital. A tipagem genética mostrou que 51 (85%) dos isolados resistentes ao fluconazol pertenciam ao mesmo grupo (tinham o mesmo ancestral comum), enquanto os isolados suscetíveis representavam uma linhagem distinta. Parte deles também era tolerante à equinocandina. As equinocandinas são usadas contra cepas de Candida resistentes ao fluconazol.

A resistência a medicamentos pode ser definida como o desenvolvimento por um microrganismo da capacidade de se multiplicar mesmo na presença de um medicamento que geralmente o mata. Quando um antimicrobiano reduz, mas não bloqueia a proliferação, diz-se que o microrganismo é tolerante àquela droga.

“A circulação da cepa resistente a drogas foi provavelmente facilitada por um profissional de saúde que falharam em realizar a higiene adequada das mãos e contaminaram os cateteres vasculares usados ​​para administrar medicamentos e outras infusões diretamente na corrente sanguínea. Isso pode acontecer quando as UTIs estão superlotadas e os funcionários sobrecarregados”, disse João Nóbrega de Almeida Júnior, coautor do estudo e pesquisador do hospital geral e universitário da FM-USP.

condições de pandemia

A cepa provavelmente também se tornou resistente a medicamentos devido ao uso indiscriminado de antifúngicos no tratamento de pacientes de alto risco com internações prolongadas. A prática é comum em pacientes com doença grave que permanecem instáveis.

“Os testes para detectar microorganismos levam tempo e em situações de emergência os médicos podem usar antibióticos e antifúngicos empiricamente, visando os agentes mais prováveis ​​de infecção. Idealmente, o tratamento da sepse [generalized infection] deve envolver o direcionamento de vários microorganismos diferentes, mas a prática tem que ser racionalizada para evitar o desenvolvimento de resistência, toxicidade e custos adicionais”, disse Colombo, que também é pesquisador e infectologista do Hospital São Paulo, hospital-escola da Unifesp.

No Brasil, a maioria centros de saúde carecem de meios para realizar testes de suscetibilidade aos antifúngicos, dificultando o reconhecimento precoce de cepas resistentes aos medicamentos. Esse problema facilita a disseminação de infecções fúngicas no sistema de saúde.

Da mesma forma, se um agente não for caracterizado antes de uma infecção ser tratada, o paciente pode receber um medicamento ineficaz. Nesse contexto, os pesquisadores enfatizaram a importância de um diagnóstico preciso antes da administração de antifúngicos, bem como a necessidade de testes moleculares abrangentes para caracterizar agentes resistentes.

O estudo mostrou que mutações no gene ERG11, normalmente considerado um indicador de resistência à classe de antifúngicos que inclui o fluconazol, estiveram presentes em apenas 35,8% das amostras. Por outro lado, todas as amostras resistentes apresentaram mutação no TAC1, que aumentou a expressão do CDR1, gene responsável pelas bombas de efluxo, mecanismo de resistência pelo qual cepas de fungos resistentes adquirem a capacidade de bombear o fármaco para fora de suas células, reduzindo sua concentração e potencial terapêutico.

Quando essa mutação genética surgiu em cepas de C. parapsilosis originalmente sensíveis ao fluconazol, as doses do medicamento tiveram que ser aumentadas em oito vezes para começar a inibir seu crescimento. Outras mutações foram encontradas no gene FKS1, em uma região onde alterações do gênero são incomuns.

“Eles são tolerantes ao medicamento. Matá-los exige doses maiores. Isso significa que em breve poderemos encontrar cepas resistentes a essa classe de medicamento, atualmente prescrito para fungos resistentes ao fluconazol”, alertou Almeida Júnior.

Recomendações

Diante da análise desse surto, os pesquisadores enfatizam a importância da realização de testes para detecção de fungos resistência a droga em centros médicos e recomendam o uso de anfotericina B lipossomal para combater a Candida resistente a medicamentos, embora possa ter efeitos colaterais adversos e custa mais do que fluconazol ou equinocandinas.

“Precisamos estabelecer algoritmos de tomada de decisão e biomarcadores para usar antibióticos e antifúngicos com parcimônia, nas doses e nos horários certos. Isso evitaria o surgimento de cepas resistentes”, disse Colombo, que trabalha com a Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária autoridade, sobre protocolos de tratamento de infecções fúngicas pelo SUS, o serviço nacional de saúde.

O uso indiscriminado de antibióticos também é um fator de risco para infecções fúngicas, acrescentou. Eles matam microorganismos intestinais e podem tornar as paredes dos intestinos mais permeáveis, deixando entrar na corrente sanguínea fungos do gênero Candida que vivem no intestino humano, mas não causam doenças em condições normais.

As infecções sistêmicas por Candida ocorrem sobretudo em ambiente hospitalar, onde há pacientes imunocomprometidos e procedimentos invasivos como hemodiálise, ventilação mecânica e administração de drogas intravenosas podem permitir a entrada de Candida na corrente sanguínea.

Entre os pacientes da amostra do estudo, 54% estavam em uso de cateter no momento do diagnóstico da infecção. A taxa de mortalidade geral em 30 dias foi de 59,6%.

Mais Informações:
Farnaz Daneshnia et al, Determinantes da resistência ao fluconazol e tolerância à equinocandina em isolados de C. parapsilosis causando um grande surto de candidemia clonal entre pacientes com COVID-19 em uma UTI brasileira, Micróbios E Infecções Emergentes (2022). DOI: 10.1080/22221751.2022.2117093

Citação: Surto pós-pandêmico de fungos resistentes a medicamentos no Brasil decorrentes do abuso de medicamentos e UTIs cheias (2022, 30 de novembro) recuperado em 30 de novembro de 2022 em https://medicalxpress.com/news/2022-11-post-pandemic-outbreak -drug-resistant-fungus-brazil.html

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